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O que se deve evitar para haver uma boa lecionação da filosofia?
Já vimos que o mecanicismo é um dos extremos a evitar (Vícios do ensino da filosofia: mecanicismo). O outro extremo é o organicismo, em que se parte da perspetiva do humano como um organismo que se desenvolve por si mesmo.
Aqui é totalmente desprezada a componente expositiva dos conteúdos para se valorizar apenas o trabalho prático do aluno e a sua construção do conhecimento. No entanto, esta conceção de ensino levanta alguns problemas, pois os alunos aprendem filosofia sem quaisquer referências e ignoram as melhores respostas e teorias que se conceberam ao longo da história, como se começasse tudo a partir do zero. |
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Ora, ao prescindir-se por completo dos aspetos expositivos do ensino, ignorando-se, por conseguinte, os instrumentos básicos de fazer filosofia (como saber lógica formal e informal, saber negar proposições ou saber avaliar a cogência argumentativa, entre outros) e ao ignorar-se algumas das melhores teorias filosóficas que se construíram ao longo da história, o debate de ideias pode cair numa mera conversa de café superficial e desinteressante com muitas confusões e erros básicos.
Além disso, o desconhecimento bibliográfico relevante acaba por fazer a discussão perder qualidade e ao proporcionar-se isto na sala de aula, acaba-se apenas por brincar aos filósofos e esquecer as grandes teorias, argumentos e objeções que têm sido avançadas ao longo dos séculos para responder aos problemas filosóficos.
Adquirir este conhecimento é importante, uma vez que os alunos podem aprender a fazer filosofia pela análise crítica das teorias e dos erros dos filósofos – evitando cair, também eles, nos mesmos erros –, pelo contacto com outras perspetivas e até pela capacidade de propor outras soluções. Os alunos ficam certamente a ganhar ao conhecerem o progresso realizado em filosofia, os instrumentos básicos da filosofia e as suas melhores teorias e argumentos, ficando assim habilitados a avaliar os argumentos e as suas limitações, a fazer clarificações, a contribuir crítica e criativamente para as teorias e problemas filosóficos, em suma, a discutir ideias com maior competência e rigor.
Será, então, a conceção orgânica plausível para o ensino da filosofia?
Não, sobretudo por dois motivos:
1) o desconhecimento dos instrumentos filosóficos e de informações teóricas relevantes pode baixar substancialmente a qualidade da filosofia;
2) pode-se correr o risco de a aula se tornar um mero espaço de entretenimento e sem aprendizagem relevante da filosofia.
Domingos Faria
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